Novos projetos para centrais solares

Central da Ourika, em Ourique, ocupa 100 hectares, tem 46 megawatts e funciona desde 2018. D.R.

A corrida ao sol em Portugal começou há já alguns anos mas está a atingir uma escala que nem mesmo os mais otimistas defensores das energias renováveis imaginavam: a REN – Redes Energéticas Nacionais tem em mãos cerca de 400 pedidos de ligação à rede para novas centrais elétricas. Estes pedidos, na sua larga maioria para projetos de energia solar, somam 80 mil megawatts (MW).

Para se ter uma noção do que isso significa, basta ver que atualmente a potência instalada para produzir eletricidade em Portugal, juntando renováveis e centrais termoelétricas, ronda os 22 mil MW. Esta capacidade não é sequer usada na sua totalidade (uma vez que inclui fontes intermitentes, como a eólica e a hídrica, e fontes que produzem sobretudo quando há menos recursos renováveis, como as centrais alimentadas a carvão e a gás). Dados da REN mostram que no ano passado o pico de produção teve 11.800 MW em uso.

A acentuada procura por novas centrais solares em Portugal materializou-se no segundo semestre do ano passado: a partir de junho a REN começou a ser inundada por uma avalanche de pedidos de promotores, em que estes solicitavam à empresa a ligação à rede dos seus projetos de produção de energia, assumindo os promotores os custos das infraestruturas de rede que tenham de ser construídas de raiz para que as novas centrais possam funcionar.

A vaga de pedidos de ligação a expensas dos próprios promotores deixou a REN sem capacidade de resposta. A concessionária da rede elétrica pediu então ajuda ao Estado para definir critérios que lhe permitam hierarquizar os projetos em função da qualidade e viabilidade de cada um.

A Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG) acaba de definir a metodologia que o operador da rede deverá seguir para poder aprovar ou não os pedidos de ligação à rede das centenas de projetos de novas centrais solares.

Assim, serão ponderados vários critérios relativos à fiabilidade do sistema elétrico nacional e à sustentabilidade territorial e ambiental. Cada critério terá uma determinada pontuação, de forma a que os projetos possam ser hierarquizados para efeitos de aprovação pela REN e concretização das empreitadas de ligação à rede elétrica.

Um dos critérios mais relevantes agora definidos pela DGEG é que os promotores terão de apresentar à REN um “comprovativo do direito de uso de terrenos para implantação do centro electroprodutor”, que pode ser a escritura de compra e venda do terreno, um contrato de arrendamento, um direito de superfície ou um contrato promessa “com eficácia real”.

Esta é uma questão crítica, uma vez que além da solidez financeira (que permite a um promotor encomendar os painéis solares e restantes equipamentos para construir uma central fotovoltaica) a concretização dos projetos solares de larga escala está dependente da existência de grandes áreas de terreno onde implantar a central. Muitos promotores têm vindo a desenhar enormes projetos fotovoltaicos para instalar em Portugal, aproveitando o custo cada vez mais reduzido da tecnologia fotovoltaica, mas há um risco de que grande parte desses projetos não saia do papel pela incapacidade dessas empresas de comprar ou arrendar terrenos.

Adicionalmente, os promotores também terão de apresentar à REN uma memória descritiva dos seus projetos, que identifique de forma detalhada as áreas onde a central solar será instalada, bem como o traçado possível das linhas de ligação à rede.

Outro critério relevante será o contributo para a segurança do sistema elétrico. Na avaliação dos projetos será dada uma pontuação superior aos que juntem renováveis e baterias com um mínimo de 5% da potência da central e duas horas de capacidade de armazenagem.

O secretário de Estado da Energia, João Galamba, indicou em entrevista ao Expresso que muitos promotores já entregaram à REN documentação detalhada sobre as suas centrais, em linha com os termos de avaliação agora definidos, mas as empresas que não o tenham feito ainda terão 120 dias para apresentar essa documentação. A partir daí a REN poderá excluir os projetos que não cumpram os requisitos e hierarquizar os restantes, para efeito de celebração dos acordos de ligação à rede.

NOVO LEILÃO DE RENOVÁVEIS SERÁ LANÇADO ATÉ FINAL DE MARÇO

Segundo João Galamba, o Governo está a trabalhar para até ao final de março realizar uma sessão pública de esclarecimento sobre o novo leilão de energias renováveis, que é aguardado pelas empresas de energia com expectativa, depois de o leilão de julho do ano passado ter registado uma forte procura, que fez o preço de venda da energia solar alcançar um novo mínimo mundial.

O governante admite que a licitação propriamente dita ocorrerá já depois de março. O leilão atribuirá capacidade de ligação à rede para projetos com fontes renováveis, admitindo pela primeira vez a ponderação de empreendimentos com produção despachável, isto é, projetos que tenham baterias ou outras formas de armazenagem de eletricidade que lhes permitam injetar eletricidade na rede a qualquer hora e não apenas quando há sol ou vento.

A forte procura por localizações para novas centrais solares de larga escala em Portugal resulta, por um lado, do custo cada vez mais reduzido dos painéis fotovoltaicos, que torna o custo da energia solar especialmente competitivo com outras fontes, e, por outro lado, das boas condições existentes em Portugal para estes projetos, quer pelos níveis de radiação solar, quer pela existência de terrenos, sobretudo no Sul do país, para instalar centrais de larga escala.

Diversos fundos internacionais têm olhado para os projetos fotovoltaicos de larga escala como uma solução de investimento interessante, capaz de gerar um rendimento estável e previsível em períodos relativamente longos, ao abrigo dos contratos de venda de energia habitualmente firmados entre os promotores e os comercializadores de eletricidade, que assim podem adquirir energia renovável para revenda aos seus clientes, por vários anos.

In Expresso – 17.02.2020